segunda-feira, 2 de julho de 2012

Dica de leitura- Ensaio da ironia - Guia politicamente incorreto de Filosofia




Luis Felipe Pondé




E NÃO ADIANTA XINGARPodem-se prever vitupérios ressentidos contra a crítica devastadora que Luiz Felipe Pondé faz da cultura “politicamente correta”. Bem mais difícil será responder a ela


O mundo virou um churrasco na laje.” A blague aparece como subtítulo do capítulo intitulado Viajar Jamais, diatribe contra a devastação cultural promovida pelas “hordas de turistas” que invadem catedrais com suas câmeras. A referência a um hábito festivo comum dos subúrbios brasileiros vai eriçar aquelas almas sensíveis que costumam oferecer sua abstrata solidariedade aos oprimidos.

Podem-se prever os xingamentos que se erguerão contra o autor: “elitista, conservador”. Professor da Faap e da PUC de São Paulo, filósofo com formação nas universidades de Paris e de Tel-Aviv, Luiz Felipe Pondé é talvez o mais sardônico crítico dos clichês da intelectualidade esquerdista contemporânea.

Para esclarecer que sua referência nada lisonjeira a hábitos suburbanos não se deve confundir com discriminação social, ele atiça ainda mais os ânimos: diz que se refere apenas aos “pobres de espírito”, porque “você pode ter dinheiro e ainda assim ter espírito de churrasco na laje” (já se ouve a grita: “preconceituoso, direitista”).

Um dos prazeres de seu Guia Politicamente Incorreto da Filosofia (Leya; 224 páginas; 39,90 reais) está nesta verve ácida, despida do jargão que se costuma ouvir dos filósofos, digamos, profissionais.
Mas não se confunda estilo claro e direto com leviandade. Enquanto seus inimigos vociferam adjetivos cada vez mais esvaziados de sentido (“reacionário, fascista”), Pondé constrói seus argumentos com rigor.
O título pode sugerir uma revisão da história da filosofia pautada pela “incorreção”. Mas, na verdade, este é um devastador exame filosófico do próprio politicamente correto, de suas origens e vícios. Pondé recorre a um eclético elenco de filósofos — Maquiavel, Burke, Hume, Nietzsche — para desmontar as ilusões queridas da tribo PC.
Também busca instrumentos fora da tradição filosófica, em escritores como Nelson Rodrigues e Philip Roth e até na teoria evolucionista de Charles Darwin (o que desconcertará os inimigos que tentam grudar em Pondé, conhecedor profundo do pensamento religioso, a pecha de carola).

O Guia denuncia a vacuidade conceitual do receituário PC, contestando, por exemplo, a noção romântica de que índios são moralmente superiores aos civilizados, ou o contrassenso segundo o qual as diferenças entre homens e mulheres são “construções sociais” sem base biológica.
Mas, sobretudo, este é um ataque moral à santimônia hipócrita da correção política, à falsidade de todos que se julgam paladinos da justiça social. Poderia ser um convite à autocrítica, se esta fosse possível ao politicamente correto. Seus cultores preferem sempre vituperar contra a inteligência.
Publicado em VEJA de 25 de abril de 2012, por Jerônimo Teixeira)

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