Carlinhos Cachoeira foi vítima de um mal-entendido. O “empresário da contravenção” (como foi apresentado na Voz do Brasil) foi às compras em Brasília e, ao que se saiba, pagou tudo o que consumiu. Ninguém se sentiu lesado por ele, não se ouviu uma só voz reclamando de calote. É legítimo concluir, portanto, que as belas cifras entoadas nas escutas telefônicas tenham chegado direitinho aos destinatários. Por que, então, perseguir esse homem?
Antigamente, comprar deputados e senadores era ilegal. Mas os tempos mudaram, e só o advogado de Cachoeira não viu. Márcio Thomaz Bastos, o ex-ministro da Justiça, insiste em pedir habeas corpus para o cliente, preso no Rio Grande do Norte, alegando que ele não tem antecedentes criminais. Perda de tempo. Assim como o ex-ministro pode ser muito bem pago com o dinheiro sujo do bicheiro, Demóstenes Torres e companhia podem privatizar seus mandatos à vontade para servir ao “empresário da contravenção”.
Esse caminho foi aberto justamente pelo governo ao qual Thomaz Bastos serviu.Comparado ao esquema das mesadas para deputados, que ficou conhecido como mensalão, a engrenagem de Cachoeira é brinquedo de criança. A boa notícia para o mercado de compra e venda de parlamentares é que, sete anos depois do mensalão, ninguém foi punido.
Por que o ex-ético Demóstenes e seu patrocinador caça-níqueis vão se constranger, com tantos mensaleiros à solta, vagando por Brasília e lhes dando bom dia de cara limpa?
Acusado de chefiar a quadrilha, José Dirceu manda e desmanda no governo da companheira de armas Dilma Rousseff – que o prestigia publicamente, em eventos apoteóticos do partido.
Diante disso, que mal haverá em acolher no gabinete um bicheiro de estimação?
Num erro imperdoável para grandes advogados, os defensores de Cachoeira e Demóstenes não atentaram para a jurisprudência: comprar parlamentares, desde que por uma causa popular e progressista, é legítimo. E não vale a ressalva de que o mensalão será um dia, quem sabe, julgado.
O processo do mais grave escândalo da história da República foi travado politicamente na Justiça brasileira, atravessando três eleições (indo agora para a quarta), o que garantiu a sobrevivência de seus protagonistas e do projeto de poder do PT. Na prática, a absolvição já se deu. O crime compensou. Só faltam um projeto de lei criando o Bolsa-Bingo e outro criando cotas para mulheres nas fábricas de caça-níqueis. O que o senador e o bicheiro farão para provar que sua causa também é popular e progressista é problema deles. Mas não será difícil.
A conexão Dirceu-Delúbio-Valério, com o apoio dos bancos BMG e Rural, criou um duto das empresas estatais para os cofres partidários. Se isso não tirou o status progressista do governo popular, até a jogatina pode ser de esquerda.
Aí só será preciso um mínimo de criatividade por parte do contraventor e de seu representante no Congresso: um projeto de lei criando o Bolsa-Bingo, outro instituindo cotas para mulheres nas fábricas de caça-níqueis e, mais importante de tudo, uma choradinha em público, que no Brasil não tem erro.Os éticos, ou pelo menos os ex-éticos, não haverão de admitir a condenação do senador e do bicheiro por um crime que o mensalão revogou.
Desde 2005, a posição da corte suprema foi clara sobre esse caso: dos discursos inflamados de Nelson Jobim, então ministro do Supremo Tribunal Federal, em defesa de José Dirceu, ao pronunciamento em dezembro último do revisor do processo, Ricardo Lewandowski, sobre a possibilidade de parte dos réus nem sequer vir a ser julgada: “Não há dúvida nenhuma de que poderá ocorrer a prescrição (dos crimes)”.
Após sete anos de trabalho cuidadoso da Justiça, às vésperas de mais uma eleição e da extinção dos processos, o revisor do caso informa sobre a perspectiva de julgamento do mensalão: “Não tenho uma previsão clara”. Tradução: a anistia aos parlamentares comprados (ou alugados) e seus contratantes vai muito bem, obrigado. A diferença para o caso Cachoeira é que o contratante é “empresário da contravenção”, enquanto no mensalão os contratantes eram, por assim dizer, “servidores públicos da contravenção”. Os contratados não ligariam para essa diferença.
O Brasil tem duas opções: ou se manca e sai às ruas contra o arquivamento do mensalão ou aceita de uma vez por todas ser governado pelos companheiros da contravenção.
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