sexta-feira, 20 de setembro de 2013

É pela afronta à dignidade












Quando Roberto Barroso, o “novato”, e Celso de Mello, o decano, decidiram demonizar as “multidões”, vociferando contra o clamor popular, eu fiquei aqui a me perguntar: “Mas a que clamor se referem estes senhores? Onde estão as multidões?”. Os truculentos já haviam expulsado do espaço público o povo de verdade enquanto aqueles dois batiam a mão do peito para exaltar a própria independência. Foi constrangedor. Não honra a biografia de um e não ajuda a construir a do outro. A miríade de grupelhos de esquerda, muitos deles financiados com dinheiro público, que alimentavam os protestos por intermédio das redes sociais já havia retirado o time de campo, num rápido processo de desmobilização. O PT foi muito eficiente no trabalho de contenção. E os setores da imprensa que estavam brincando de Primavera Árabe resolveram arrumar outra distração.

Se eu tivesse alguma dúvida — na verdade, como vocês sabem, nunca tive — sobre o real caráter das manifestações de junho, ela teria se dissipado agora. Não era “pelos 20 centavos”? Pois bem. Poder-se-ia criar agora o movimento “não é pelos R$ 170 milhões” — mais ou menos o valor a que se chegou na pequeníssima fatia do mensalão que foi investigada. O poder real do PT está hoje nos fundos de pensão, que conseguiram passar incólumes pela investigação. Onde estão os protestos?

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra a impunidade.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra um grupo que ousou se organizar para tomar a democracia de assalto.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra uma Justiça que se mostra incapaz de garantir aos réus as seguranças próprias de uma democracia e, ao mesmo tempo, demonstrar que essa democracia repudia o malfeito.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra uma óbvia operação de captura do Poder Judiciário por um partido político.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra uma Justiça que parece organizada para proteger malfeitores.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra o uso de dinheiro público para criar na Internet e nas redes sociais uma teia de apoio a larápios, que fraudaram o estado de direito.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra o uso de uma lei de incentivo à cultura para cantar as glórias de corruptos, peculadores e quadrilheiros.

Não é só pelos R$ 170 milhões, mas é também contra partidos e lideranças de oposição que silenciam diante do risco da impunidade.

Que fique claro! Não estou duvidando dos motivos de milhares que foram às ruas e da justeza de algumas de suas reivindicações. Estou aqui a destacar, isto sim, que aqueles protestos foram superestimados e, em boa parte, estimulados por setores da imprensa que tentam colar nas redes sociais num esforço meio desesperado e vão de acompanhar o frenesi. Ao fazê-lo, perdem profundidade, capacidade de análise e, infelizmente, a devida prudência.

Quaisquer que tenham sido os motivos que detonaram aqueles protestos — já escrevi muito a respeito —, nada aconteceu de mais grave do que o Poder Legislativo tentar inaugurar a sua “facção Papuda” e o risco de a corte suprema sofrer uma desmoralização inédita em tempos democráticos. Não, senhores! Não é só pelos R$ 170 milhões — só o escândalo recém-descoberto no Ministério do Trabalho pode chegar a R$ 400 milhões.

É pela afronta à dignidade.Por Reinaldo Azevedo

Nenhum comentário:

Postar um comentário