A cruzada antitabagista segue com força total. Após a obrigatoriedade daquelas imagens terríveis no maço de cigarros, da suspensão de propagandas e do banimento dos "fumódromos", eis que a Anvisa aprovou agora a proibição de sabor nos cigarros. O objetivo da agência está evidente: querem sumir com o tabaco da face da Terra.
Há duas maneiras de se criticar esta postura. A primeira delas é com base em princípios, tais como a liberdade individual. Não cabe ao governo nos proteger de nós mesmos. Viver é sempre uma aventura arriscada. Cada um deve ser livre para escolher como encarar esta jornada, assumindo a responsabilidade por seus atos. Parte da liberdade é o direito de escolher ir ao "inferno" à sua maneira.
Ninguém ousaria afirmar que os indivíduos desconhecem os riscos associados ao tabaco. Eles já são mais do que divulgados. Ainda assim, deve ser um direito inalienável assumir tais riscos, se esse for o desejo. O risco de vício também é conhecido antes de o sujeito começar a fumar. Além disso, vários outros produtos podem viciar, inclusive o álcool. O abuso de alguns não deve tolher o uso dos demais.
Uma pessoa pode levar uma vida de abstinência total das substâncias prejudiciais à saúde e sofrer um acidente ou mesmo contrair uma doença terrível como o câncer.
Outra pode beber, fumar e viver uma longa vida - menos chata, diriam alguns. A probabilidade de ele ter câncer de pulmão pode ser maior, mas impedi-lo de optar pelo risco é solapar sua liberdade mais básica.
Adotar políticas intervencionistas somente com base nas probabilidades é ignorar o indivíduo e a sua singularidade. Regimes coletivistas, como o nazismo, o comunismo e o fascismo, seguiram esse caminho, desembocando no totalitarismo. O indivíduo passa a ser um simples meio sacrificável pela maioria.
Alguns argumentam que o fato de existirem impostos para manter o SUS justifica tal intervenção. Se nós pagamos a conta, então podemos impor restrições aos outros para reduzir o risco de doença.
Trata-se de uma linha de raciocínio que leva inexoravelmente ao totalitarismo. Com base nela, o governo poderia também obrigar cada um a praticar exercícios físicos diariamente, além de cortar a fritura, a gordura, o sal e o açúcar. Tudo em prol da saúde geral.
A segunda forma de atacar a postura da Anvisa é pelo resultado prático de suas medidas.
Ao dificultar a venda legal de cigarro, a agência não faz desaparecer a demanda por ele. Ela apenas transfere a oferta para a informalidade. Empregos e impostos serão perdidos, e o contrabando será alimentado - com o risco agravado pela má qualidade do produto.
Cerca de 30% do mercado de cigarros no país já é ilegal. Os contrabandistas agradecem o fervor da Anvisa em lutar pelo bem geral, tal como Al Capone celebrava a Lei Seca em Chicago.
Aliás, é no mínimo curioso que muitos dos que aplaudem a cruzada antitabagista são os mesmos que defendem a descriminalização da maconha. Incoerência total.
Muito me preocupa este movimento coordenado em busca de uma espécie de "saúde perfeita". Seria isto uma nova seita religiosa e moralista? Seria o resultado de uma geração acovardada, que pensa ser viável abolir os riscos de se viver?
Se o indivíduo quiser adotar essa postura no âmbito particular, trata-se de um direito seu. Mas, quando a coisa vira uma imposição coletivista, a liberdade corre sério perigo. As piores tiranias são feitas em nome do bem geral. Com a consciência limpa, esses tiranos são incansáveis em suas ambições "altruístas".
Apenas para constar: não fumo.
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RODRIGO CONSTANTINO
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